Eu, único

                Acordamos. É manhã. O que nos motiva a sair da cama é a perspectiva de um dia cheio de bons ares e fortunas a descobrir; temos em nosso egocêntrico ego a ideia de que somos únicos, isso nos impulsiona o passo, nos dá perspectiva. Temos a ideia de que somos singulares, que temos o “algo” que nos difere dos demais agora 7 bilhões que preenchem a vastidão do mundo. Acreditamos que nossas percepções são auto-sugeridas, que nosso estilo é próprio, que nossas conclusões são diferenciadas... O que não passa de ilusão das mentes perturbadas que somos nós(es).

                O mundo exige isso, exige uniformidade. Mas as pessoas não, as pessoas exigem pluralidade, ou pelo menos a ilusão de uma.
                Enfim, o que temos são “pacotes”, temos pacotes diferentes. Dentro destes pacotes temos pessoas. Você nasce dentro ou escolhe um destes, mas são pacotes coletivos, não se dá para criar um pacote onde só caiba a sua figura. Temos os estilos tal e tal, escolha um. Este É VOCÊ.
                Esboço o mais amarelo dos sorrisos que tenho quando penso que em qualquer esquina posso trombar com meu duplicado, que no sentido original da palavra é uma atribuição errada à frase, uma vez que não somos apenas dois, muito provavelmente existem bem mais eus do que eu e mais um. Esboço meu sorriso amarelo e triste. É triste tomar conhecimento de alguns peculiares fatos ao longo da vivência neste planetinha azul, e olha que minha vivência ainda é curta. Mas no final é isso, é a barganha inevitável que o Universo faz conosco: queres respostas? Esclarecimento das dúvidas? Pagas com sua felicidade. Mas ai também há outra ressalva a se fazer. Posso dizer que, se reflete sobre o mundo de forma perspicaz e lógica e ainda consegue ser feliz, sua felicidade é bem mais genuína e honesta que a do medíocre.
                São raros aqueles que não querem o mundo nos braços, a grande maioria de nós tem planos de enriquecer com alguma ideia esplendida, talvez um lapso de iluminação advinda do próprio Deus, o que nunca é esperar demais, afinal estamos sempre esperando a mãozinha do Onipotente. Ora bolas, se pode mover montanhas com um olhar, se pode alagar a terra com chuvas, por que não corrigir alguns zeros na minha conta? Poxa vida, é algo tão simples de ser feito.
                O nosso espírito unitarista nos diz que somos únicos, que temos personalidade, que temos um sorriso cativante, talvez; que temos a faca e o queijo na mão para fazermos a mágica perdurar e sermos bem sucedidos; que o mundo é nosso quintal. Bem, estamos com um resquício de antiquadas tradições se assim for, pois ainda hoje cagamos no quintal.
                Não é piegas demais? A piada trágica do ser humano tentando tocar sua vida. Dizendo que é senhor do seu mundo, e que nele reina soberano; que sabe exatamente seu trajeto e que tem o controle da situação; que escolheu a camisa rosa por que quis; que fez Direito por que quis; que comprou a referência em computadores do ano por que quis; que montou um blog por que quis; que é o que é por que quis; que só ele é desse jeito no mundo.
                Nem nosso nome é único, seu Cadastro de Pessoa Física é mais único que seu nome. Você é mais número que nome, partindo do princípio da singularidade. A única coisa que lhe diferencia dos outros 7 bilhões é... bem, nem eu tenho uma resposta. Whatever, nunca prometi respostas, de qualquer forma. Como é que poderíamos ser únicos em um mundo que precisa produzir em larga escala, construir em larga escala, destruir em larga escala, emburrecer em larga escala. É impossível.

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Ps: Feliz natal pra todo mundo... Amanhã tem PODCAST ESPECIAL PRA VOCêS
(mas não é sobre natal)

Um comentário:

  1. Simplesmente a pura verdade.
    Cara seus textos são incríveis parabéns, espero um dia poder comprar vários livros seu.

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