Desafio "Narrativa Retalhada" - 3/5

Terceira parte do desafio Narrativa Retalhada
Dia 12 é com o Ian. Boa sorte!
Enjoy!
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      Por alguns milésimos de segundos fiquei paralisado como se nada mais importasse, me concentrei um pouco a busca de alguma lembrança — aquilo me parecia tão familiar —, mas os fortes passos em correria se aproximando me despertou do transe e me pus a correr novamente. Não sabia mais de o porquê estar correndo, talvez fosse até um medo irracional de minha parte fugir de uma multidão desesperada e tão determinada em me pegar. Como saber se é irracional? Quiça eu dê sorte de ver outra pessoa numa situação semelhante a minha, daí pergunto a ela. Aproveito e pergunto sobre medo do escuro também...
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      Tal pensamento se tornou irrelevante quando Grégore desceu uma rua extremamente inclinada. Passou por três mercadores ambulantes, que empurravam suas bancas de venda em direção contrária a de Grégore, os quais curvaram seus carrinhos para o lado, para ver a curiosa situação de um homem desnudo correndo em alta velocidade entre as ruas pela manhã, de forma a bloquear a estreita rua. Tendo a nudez lhes chocado mais que a aflição do "homem" ou mesmo a presença de um cordão umbilical, de forma distraída acabaram por barrar a comitiva que o perseguia.
      Com estes segundos extras que Trevor acabara de ganhar poderia ganhar distância e despistá-los. Percebendo isso Grégore dispara na frente gastando o último de seus fôlegos para garantir a vantagem, dobrando a primeira esquina em seu caminho.
      Não demorou mais que vinte segundos para que os mercadores liberassem o caminho, o grupo passasse se estreitando em uma fila indiana e retomassem a caçada, dobrando o mesmo quarteirão que a presa. Indo até o final da rua, onde ela acabava, o grupo se separou em dois, indo metade para a direita e a outra para a esquerda. Independente do rumo que tinha tomado Grégore, mesmo com a vantagem, ele provavelmente seria pego, já que membros da guarda-real e jogadores de futebol tem uma boa resistência física e ele já estava bastante cansado.
      No entanto, se ele seria pego, não seria por agora, pois naquele momento em que Trevor tinha virado aquela esquina, havia avistado uma árvore na calçada e imediatamente decidira se esconder em sua copa, em meio a folhagem, colocando o livro na boca e a escalando, pois já não aguentava mais correr. Com sorte ninguém o notou lá em cima.
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      Quando todos já haviam sumido de meu horizonte e eu fazia menção de descer, vi um vigia noturno vindo pelo mesma esquina que vim. Parando exatamente em baixo da árvore, temi que ele também estivesse me perseguindo e que havia me visto, porém ele só havia parado para pegar seu molho de chaves, pois a casa da frente era sua. Entretanto ao entrar uma curiosa cena aconteceu: Pela janela saiu um homem pelado e aparentemente armado, mas não consegui ver direito de onde eu estava. Saiu com suas roupas em mãos desesperado e apressado, mas ao mesmo tempo sorrateiro, e rapidamente sumiu de minhas vistas também.
      Ao descer percebi que em baixo da janela o homem havia deixado um sobretudo marrom e um estiloso chapéu que combinavam em cor, os quais acabei me apossando. Ajeitei o livro cuidadoso e discretamente num dos bolsos internos e caminhei apressado por uma rota desconhecida.
      Ainda estava com fome, com dor, com sede, com fome e com vontade de ir ao banheiro e vendo ao longe uma Panificadora & Lanchonete fui em sua direção, mas por algum motivo primitivo meu junto a um movimente involuntário entrei em uma livraria que se tinha um pouco antes.
      Ao entrar o dono sugeriu que eu deixasse o casaco na entrada, mas expliquei que seria breve, perguntando se ele me poderia ceder o banheiro para utilizar. Com simpatia ele me indicou o caminho. Contudo parei no meio do caminho e vi um livro que me chamou a atenção. Não sei ao certo o que me chamou a atenção, não tinha uma capa nada bonita, parecia ser velho e nem tinha um título interessante, estava num canto esquecido, comum aos livros de terceira mão.
      Abri-o e comecei a ler freneticamente, as páginas discorriam entre meus dedos com naturalidade me contando segredos e histórias, e eu ia adquirindo animação, força e vitalidade, me saciando a cada virar de páginas, de forma a esquecer as necessidades primárias do corpo, simplesmente não precisavam mais ser atendidas, mas ainda sim fui ao banheiro.
      Olhei no espelho pela primeira vez e não reconhecia o rosto que visualizava. Percebi uma notória tatuagem do lado esquerdo do meu rosto que começava acima de minha sobrancelha ia até a orelha e havia duas ramificações que desciam, uma para baixo do meu olho e outra para bochecha. Definitivamente eram palavras, mas o que estava escrito e em que idioma eu não saberia dizer.
      Aproveitei o momento sozinho, abaixei a tampa do vazo e me sentei. Enfiei a mão no bolso do casaco, afim de ler finalmente o livro, e senti um objeto estranho: era papel, volumoso, porém pequeno. 'Será que estou sugando o livro pelo meu cordão umbilical, me alimentando dele para poder existir e fazendo ele encolher?' Senti muito medo de não poder ler a única esperança que poderia devolver toda minha memória e explicar minha existência.
      Ao trazer para meu campo de visão vi que se tratava de um masso de notas de dinheiro. Só então me dei conta que era o bolso errado. Devolvi o dinheiro ao seu esconderijo e destinei minha mão ao bolso certo.
      Não obtive sucesso, pois inesperadamente ouvi um barulho extremamente alto, como se algo supersônico estivesse quebrando a barreira do som do meu lado, e quando percebi já estava junto ao chão. Saí para ver o que era, mas estranhamente as pessoas se comportavam como se nada houvesse acontecido. Muitos livros estavam agora no chão, mas ninguém mostrava nenhuma reação.
      — O que houve?
      — O que houve onde?
      — Este barulho e este tremor?
      — Do que está falando? Você tem labirintite?
      — Hmm... Não que eu saiba. O que labirintite tem haver com tudo isto?
      — Não sei exatamente, mas labirintite não tem algo haver com o ouvido interno e com tonturas? Talvez tenha e não saiba, já que está falando sobre o chão mexer e ouvir coisas.
      — Mas se é coisa da minha cabeça, como é que você me explica estes livros aí no chão?
      — Meu Deus o que aconteceu? Não estavam assim a um segundo atrás. Como aconteceu alguma coisa e eu não percebi nada? Será que este lugar é amaldiçoado? Fantasmas? — entrando em um estado de choque ele então fechou os olhos por alguns segundos e recuperou a calma.
      Diante desta situação assaz bizarra me dirigi a saída, parando rente a porta de vidro. Girei 180 graus e perguntei:
      — O senhor já ouviu falar de algum escritor chamado Machado de Eugênio?
      Após uma longa pausa.
      — Não é um escritor, é um grupo de escritores. Curiosamente conheço-os, apesar de não serem famosos ainda. Possuem interessantes escritos. Muito bons por sinal. Recomendo!
      — Sabe onde posso encontrá-los?
      — Na verdade não. Conheço só seus livros. Deixe-me pegar um para ver se tem algo sobre os autores em alguma contracapa.
      — Antes de ir poderia me arranjar algum calçado?
      — O que aconteceu com os seus?
      — Devo tê-los perdido ontem a noite.
      — Infelizmente só tenho livros nesta velha loja, que por sinal é assombrada. Mas qualquer coisa tem uma loja de calçados a uns 50 metros daqui, logo depois da lanchonete. Me espere aqui, vou pegar o livro, volto já.
      Então um intenso brilho clareou o céu. Saí lá fora para ver o que era. Aparentemente só eu notei novamente. Vi no céu um rastro de fumaça, como se mostrasse a trajetória de um objeto em queda. Não dei mais que três passos para fora da loja e vi aquele rei e o padre que me perseguiam. Por sorte não me viram, estavam de costas.
      Tentei agilmente voltar para a livraria antes que algum deles me vissem, mas antes que eu pudesse mover algum músculo, alguém por de trás de mim colocou um lenço em meu nariz e boca, pressionando contra minha face assiduamente.
      Senti um cheiro doce vindo do lenço e então desmaiei. Mas antes de apagar totalmente, senti que estava sendo arrastado de volta para a livraria. Foi quando então lembrei-me de uma coisa de quando eu ainda era objeto.
       ...
Алиссон P
Continuation

- troca de narrador

Um comentário:

  1. O melhor é que conseguiu fazer ter lógica!
    Muito boa a parte da livraria, e a fuga e o (pseudo)final.

    Agora é esperar pelo que virá...

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