Mais um Halloween esquecido

      Durante a lua cheia o homem nu entrou pela janela da cozinha, pegou uma faca e subiu as escadas, não encontrando ninguém em seu caminho. Mas as luzes estavam acesas, o que indicava que logo ele teria sua vitima, em algum próximo comodo da casa. Sua sede de sangue iria ser saciada e ninguém poderia impedí-lo.
      Ao revirar toda a casa viu que não havia ninguém. A garagem estava vazia, as portas trancadas e as janelas, com exceção daquela que ele usou para entrar, estavam fechadas. Estava óbvio que quem é que morasse ali tinha saído e deixado as luzes acessas ou por desleixo ou para tentar enganar algum tolo assaltante amador. Não se importando com qual fosse o caso ele subiu, pegou um vestido vermelho tomara-que-caia curto, se vestiu e saiu pela janela novamente.
      Antes de ir embora, desligou o a chave-geral de energia da casa, pois, claro, não iria aturar aquele desaforo de desperdício de eletricidade. Amaldiçoou os moradores daquela casa, foi até a porta da frente, que era de madeira bem trabalhada, e fincou a faca ali. Foi embora.
      As estátuas — aqueles observadores silenciosos — viram toda a cena e, naquele momento, pensaram já ter aproveitado tudo do que aquele lugar poderia oferecer e que era sempre melhor sair após o ápice dos fatos interessantes. Quando então uma pessoa que passava em frente piscou, elas se mudaram para nunca mais voltar.
      Os mortos dali que eram vigiados pelas estátuas, casados da morte, resolveram se levantar naquela noite de Halloween e esticar um pouco as pernas. Percebendo a ausência daquelas, resolveram não voltar por ora, frustando os adolescentes que chegaram em seguida para violar túmulos e fazer festas.
      Mas a frustração não durou muito, pois um lobisomem apareceu de repente no meio do grupo, aterrissando de um longo salto dado, e logo conseguiu três jovens corações, cheios de colesterol e já com alguns infartos, para sua segunda refeição da noite. Os demais se deixaram preencher pelo medo e se dispersaram.
      Fantasmas, se aproveitando da situação, se apoderaram dos três corpos sem vidas e já sem almas para andar pelas ruas, que mesmo com o forte cheiro da Morte, as pessoas ignoravam-os, achando até normal, tirando algumas espertas e inocentes crianças, as quais sensatamente passavam longe.
      Os fantasmas, já entediados, foram com os corpos até um museu principal da cidade,arrombaram o lugar, fazendo os alarmes soarem, e libertaram uma antiga e enfeitiçada múmia aprisionada em sua tumba.
      A polícia logo chegou ao local, viu os seguranças desmaiados e percorreram todo o museu para ver se alguma obra de arte havia sumido e se encontravam quem havia disparado os alarmes, até encontrarem três corpos jovens, fazendo do lugar uma cena de homicídio e assim nem percebendo a falta da múmia.
      Os fantasmas para terem uma visão privilegiada do caos que iria se instalar, abandonaram os corpos no museu, bagunçando os registros das câmeras de vídeo e seguiram a múmia que iria despejar milênios de ódio acumulados na população.
      Contudo, ao verem a múmia acharam terem visto a melhor fantasia de todos os tempos. Um clássico, sim, mas muito bem feita. Por isto recebeu muitos doces e especialmente chocolates, o que fez com que a múmia ficasse extremamente calma e feliz.
      Os fantasmas irritados com a falta do show de destruição possuíram a múmia para utilizarem seus poderes, mas um estranho travesti usando um vestidinho vermelho, coberto de graça, terra e cinzas colocou um colar havaiano na múmia, jogando-lhe sal, pimenta-do-reino, areia e vinagre.
      Assim como chegou foi embora, deixando na eterna morte aqueles quatro seres misticos que entraram em combustão espontânea.


      — Nossa, mas que sonho estranho! — eu disse inconscientemente para mim mesmo como se estivesse numa novela mexicana e precisasse falar meus pensamentos em voz alta.
      Limpando o suor da testa, fui até a cozinha, bebi um copo de água gelada e engasguei com esta ao me assustar com um gato preto que pulara na minha frente, me fazendo derrubar meu faqueiro e tossir por um minuto. O desgramado tinha entrado pela janela que eu tinha esquecido de fechar.
      Ao juntar minhas facas, acabei cortando minha mão, mas isto foi menos frustante do que reparar que estava faltando uma faca e não me lembrar de onde eu havia deixado-a. Mas não me preocupei com isto por muito tempo, pois estava com sono. Lavei minha mão, amarrei com um lenço e voltei para cama.
      Teria conseguido se um vampirinho gay não tivesse aparecido de repente para me dar dicas de moda. Infelizmente a conversa dele me deu insonia e por fim acabou com uma mordida no meu pescoço após ele sentir o cheiro do cangue de minha mão. "As pessoas do meu trabalho vão falar a semana inteira deste chupão. Droga!"
      Só que o tolo conseguiu se engasgar com meu sangue. Nem sabia que vampiros se engasgavam, mas até que parece meio óbvio que eles podem sim. Aproveitei para correr até a geladeira e pegar dois dentes de alhos, os quais enfiei na boca dele, por vingança, já que ele tinha tirado meu sono, e o fiz engolir.
      Deixei-o agonizando no chão enquanto twetava: Feliz Halloween à todos!

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