Por que o capitalismo deu tão certo?

      Desde que o ser humano se desvinculou do Éden, ele vive tendo como propósito, buscar a Felicidade. Mas esta parece escorregadia, pois toda vez em que esta é alcançada a ambição daquele a empurra para um "lugar" que necessita um maior alcance, com uma maior dificuldade de acesso, de modo que nos colocamos numa corrida sem fim.

      Não é segredo nem mistério também que procuramos sempre facilitar as coisas e tentar percorrer os caminhos mais fáceis da vida, e um deles é escolher o "prazer" a "felicidades". Não que não haja prazer na felicidade, ou que sejam conceitos totalmente dispersos, mas o "prazer" é apenas uma lapso da Felicidade e por isto consegue existir de for mais autônoma, enquanto a Felicidade por se só é tão complexamente simples que não poderia existir sem todas suas partes (como o Prazer). Mas não irei a muito discutir a simplicidade da Felicidade. Talvez uma outra hora.

      Onde quero chegar, é que o ser humano costuma buscar os caminhos do prazer para se satisfazer e acaba por confundir tal sentimento de satisfação momentânea como felicidade, fazendo com que ache que uma vida feliz é uma que tenha prazeres cada vez mais intensos, já que os níveis de prazeres têm que serem superados.

      'Quer descobrir qual é o verdadeiro caráter de uma pessoa? Dê poder a ela.' Creio que já devem ter ouvido falar nisso; E não é para menos. O ser humano, com sua ambição e soberba, busca, durante sua jornada de vida, adquirir cada vez mais poder (a palavra-chave deste texto talvez seja Poder). O que o cerca e o motiva é nada mais que métodos para se conseguir poder. Poder para ter seus desejos realizados. Para poder fazer com que você alcance prazeres, e, como muitas das vezes, para satisfazer o 'ego'.

      E o que é o dinheiro se não uma forma de quantizar o nível de poder que você pode exercer diante a sociedade? E é por isto que é necessário dar valor as coisas. Por isto que o capitalismo deu tão certo. Pois a ambição do homem precisa ser saciada, nem que seja na mera existência da possibilidade. Não estamos prontos ainda para aceitarmos que somos todos e quais e muito menos nos tratarmos como iguais.

se a via-crucis virou circo, estou aqui


Nunca consegui dar cambalhotas.
Invejava as outras crianças que conseguiam dar cambalhotas, cresci mais e invejei as pessoas que conseguiam escrever histórias bonitas, cresci mais e invejo as pessoas que não cresceram tanto assim. Agora que não cresço, só invejo. 


Acabou-se a pilha dos lábios, ou: Os ocos ecos da minha voz


                Contemplo o meio; nada me prende a atenção, nada me desperta vontade de me esforçar. Nada parece ter sabor. Ouço uma melancólica música, sinto a mais profunda tristeza, talvez nem mesmo o jovem Werther tenha sentido igual. Mas sou incapaz de chorar, não verto uma única gota salgada de lágrima sequer. Há um gato se debatendo na minha garganta, tão violento que me faz pigarrear sangue... ele não desce, tampouco  sobe; desde certo tempo ele está aqui, nunca o vomitei, nunca o digeri... ele permanece.
                Teria de estudar agora, mas nem para isso tenho ânimo; até teria-lo, não fosse a inutilidade do ato; não é que não seja capaz de entender as complexas teorias, não é que não fosse capaz de palestrar sobre elas por uma centena de dias. Mas: Qual o sentido, qual a razão, para quê, exatamente?
                Tenho muitos do meu lado, diria que quase todos; todos me têm em alta conta, todos sorriem quando chego, todos confabulam comigo, mas nenhum me leva a sério, sou o tipo ideal que ninguém quer senão para um eventual apontamento ou comentário, para rirem dos absurdos que falo e saírem dizendo “que ideias engraçadas aquele tipo tem, não?”. Então para quê? Vontade mesmo eu tinha era de queimar tudo, atear fogo ao circo e sair andando.
                Sou o bobo da corte, a requerida comédia; bom ter-me à mesa, ouvir-me tratar dos dilemas universais e particulares, dos mais simples aos mais complexos; mas ninguém me escuta verdadeiramente, é apenas entreter... E o pior é ter de manter a pose neoliberal de tolerância a determinadas opiniões por própria falha minha de querer agradar a todos, não por ser compreensivo, mas apenas para continuar sendo bem visto. Quando sei que o correto seria vociferar a todos que deixassem a covardia e a mesquinhez para a puta velha e que, pelo amor de deus, parassem ao menos por um segundo para tentarem algo verdadeiro.
                O pior é saber que mesmo já tendo-me mostrado incontáveis vezes com a razão, de nada adianta, é senão acaso, nada mais. Não sou legitimado nem por uma fama estúpida para ter razão em algo, tão pouco por algum título, ou por alguma quantia de cédulas em minha carteira; nada além do argumento me legitima, e este, ultimamente, não tem bastado.
                Essa história não termina como a do Werther; não cesso minha vida em um acesso de tristeza indomável. Não posso dizer certamente como termine, mas pode ser que termine com o solver de alguns dos meus sonhos e aspirações; pois Tristeza: um dos maiores solventes das vontades nossas.

O que escrever?


Sozinho, com o computador à frente, tentava escrever algo decente, como nos velhos tempos em que era apenas ver a página em branco e as ideias floresciam, os contos tomavam vida própria.

A chuva leve caia lá fora e de vez em quando uma brisa fria, vinda da janela aberta, agitava-lhe os cabelos  e o fazia arrepiar . Pensou em se levantar para fechá-la, mas não valia o trabalho. “quem sabe esse som de água caindo não me inspira”, estava se agarrando a qualquer fiapo de esperança que o fizesse voltar aos velhos tempos de criatividade.

A vida andava complicada, não se sentia mais útil, não saía mais nada daquela cabeça além do cabelo desgrenhado de quem anda desistindo até mesmo dos cuidados pessoais.

Continuou a fitar a tela em branco, começou a pensar que devia trazer a cafeteira  para a mesa de trabalho, para não ficar levantando para buscar o café, e perder a concentração. Mas por outro lado, buscar o café era o único exercício físico que fazia, se é que podia ser chamado de exercício.

O celular tocou, ele olhou o número, era seu agente... não estava com paciência para falsas palavras de estímulo, especialmente com a fome que estava, e a preguiça de descer até a cozinha para fazer um sanduíche, pensou se não devia trazer  também a geladeira para o escritório...

Paul, o agente, continuava insistindo...  enviou-lhe uma mensagem de texto “paul, estou escrevendo, não atrapalhe meu momento criativo”, o celular parou de chamar e ele voltou o olhar para a tela do computador novamente.

Anoiteceu e a fome finalmente o fez se levantar para comer algo, a geladeira estava cheia de frutas e verduras, uma tentativa da família, provavelmente, de mantê-lo saudável, pelo menos fisicamente.
Após comer, chegou a cogitar a ideia de tomar um banho antes de dormir, sentiu seu próprio cheiro, não estava tão mal, adiou o banho para amanhã.

Eram nove horas quando acordou, tomou um copo de leite com café, espreguiçou-se e se sentou á mesa, ligou o computador e achou que tinha uma ideia, poderia escrever sobre um cara que não tinha a mínima ideia sobre o que escrever...



Um país rico é um país sem gente rica




O Estado está aqui para nos livrar do “estado” bárbaro e selvagem, aquele de lobos, e nos trazer para a elevação de espírito e pensamento edificador. Sim? Se não, onde reside a inverdade na afirmação anterior? O Estado é fruto e não causa de um pensamento edificador? Ele está aqui simplesmente para nos trazer um diferente estado de barbárie e selvageria, mas este segundo velado sob a bandeira da democracia?

Talvez eu não seja capaz de responder a essas perguntas, que são ardilosas e de ordem muito filosófica para o meu modesto e símio pensar. Só sei que os homens que compõem os poderes do Estado são figuras peculiares e dignas de reflexão. Os meios são corruptíveis, as possibilidades são tentadoras e transformadoras; mas os homens, estes homens que estão no poder, estes são homens assim como nós.

O que se passa quando um sujeito pobre, minimamente assalariado, iletrado, sem suporte de saúde e com meia dúzia de filhos para criar vota no latifundiário, de família tradicionalmente abastada e dono de metade das terras da sua cidade? Uma hipótese é a de que ele realmente acredita que este fazendeiro que demonstra tamanha prosperidade no sistema capitalista tenha capacidade para gerir uma cidade e ela também fazer próspera. Outra é a de que ele crê que o poder não deve se dissociar da riqueza. E uma terceira é a de que esse homem pobre vota sem ter o mínimo controle sobre aquilo que está fazendo, ou seja, não sabe como, por que e nem em quem está votando.

Já os que estão no poder têm, sim, consciência de como funciona o voto. Eles sabem os meios, não de fazer política, mas de produzir uma imagem política: são profissionais políticos. E justamente por isso se perpetuam e até deixam herdeiros. Mas, ainda assim, o interessante aqui é constatar que nem esses profissionais políticos estão no topo da “cadeia alimentar”; não tomam as decisões finais e nem têm ciência de todos os fatos.

O capital é que movimenta a alma. Dói, dilacera, mas é uma verdade que deve ser aceita antes que consuma a vista, as ligações nervosas e até as juntas dos membros.

Um movimento que parece (só parece, pois os fatos não estão à minha disposição) estar sendo aplicado contemporaneamente é o de manufaturar candidatos a eleições. Ainda mais com o advento da “ficha limpa”, deve-se agora encontrar sujeitos idôneos, imaculados. Homens com tais características não existem no mundo voraz da política. Portanto, vemos cada vez mais artistas, pessoas populares e fantasiadas ascendendo ao poder.

Um dos maiores exemplos que me salta à mente é a excelentíssima senhora Presidente do país. Quem seria ela não fosse o PT e o oportunismo continuista? Quem seria ela não fossem as cirurgias plásticas e as diversas aulas de oratória (demagogia)? Onde estaria ela se os seus opositores fossem um tanto menos ridículos – e um tanto mais manufaturados como ela?

Um país rico é um país sem gente rica.

Pausa de 6 minutos

Comemoração da "Consciência Negra": apenas mais uma forma de segregação da humanidade (racismo)


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Compreensão sobre o pedido de laicidade do Estado (retirada dos dizeres "Deus seja louvado" das células de Reais)
Satanistas poderiam pedir os escritos "Satã seja venerado" no seu dinheiro...

extremamente alto e incrivelmente perto




"Outra coisa boa seria se eu pudesse treinar meu ânus para falar quando eu peidasse. Se eu quisesse ser extremamente hilário, eu o treinaria para dizer 'Não fui eu!', toda vez que soltasse um peido incrivelmente forte."

"E que tal microfones pequenos? E se todo mundo os engolisse e eles tocassem o som de nossos corações em pequenos amplificadores que poderiam ficar nos bolsos de nossos macacões? Quando andasse de skate na rua, à noite, você poderia escutar os batimentos cardíacos das outras pessoas e elas poderiam escutar os seus, tipo um sonar. O estranho seria se o coração das pessoas começasse a bater ao mesmo tempo, como as mulheres que moram juntos têm seus períodos menstruais ao mesmo tempo, que é uma coisa que eu sei, mas não fazia questão nenhuma de saber. Seria muito estranho, com exceção do lugar no hospital onde os bebês nascem, que soaria como um candelabro de cristal em uma casa flutuante antes que os bebês tivessem tempo de alinhar seus batimentos. E a linha de chegada da Maratona de Nova York soaria como uma guerra."

"O fascinante é que eu li em National Geographic que há mais pessoas vivas agora do que todas as que morreram na história da humanidade. Em outras palavras, se todo mundo quisesse interpretar Hamlet ao mesmo tempo, não seria possível, pois não há caveiras suficientes!"

"Na verdade, se as limusines fossem extremamente compridas, elas não precisariam de motoristas. Você poderia simplesmente entrar no banco traseiro, caminhar pela limusine e depois descer pelo banco da frente, que ficaria onde você precisava ir. Agora que parei para pensar nisso, eles podiam fazer uma limusine incrivelmente longa que tivesse o banco traseiro na VG da sua mãe e o banco da frente no seu mausoléu, e ela seria tão comprida quanto a sua vida."


Esse livro tá complicando minha vida, cutucando meu cérebro, lá dentro. Lindo pra dedéu, assim como o filme, e além. Extremamente alto e incrivelmente perto, de Jonathan Safran Foer, traduzido pelo ilustre Daniel Galera, aquele que escreveu o Mãos de cavalo. 

Ato I Cena 3

     Ela acordou assustada, mesmo tendo sido acordada carinhosamente por seu marido. Se recuperou da fadiga causada pelo sonho não recordável e reparou que uma bandeja-de-café-da-manhã-na-cama estava a sua espera. Um "bom dia" grave, mas calmo, e acompanhado de um sorriso, fez seu tímpano vibrar.
     Houve uma resposta sonolenta misturado ao ar de um bocejo incontido, e naquele momento ela percebeu que não conseguiria agir como numa atuação duma atriz de novela, que acordam sempre bem despertas, sem remelas nos olhos, de caras limpas, maquiadas e de bexigas vazias.
     Pediu uma mal humorada licença, aparentemente repentina, deixando seu marido meio desconcertado; mas ele a compreendeu parcialmente, o suficiente para não se deixar abalar. Naquele momento ele refletiu sobre a situação e pensou que provavelmente ele também não conseguiria despertar e comer algo sem uma idinha rápida no banheiro.
     Enquanto lavava o rosto, ela sentiu uma pontada de ódio daquela bandeja(-de-café-da-manhã-na-cama), que provavelmente teria sido comprada por um preço altíssimo (já que aquilo era um item de pouquíssima utilidade para o dia-a-dia e que só servia para satisfazer desejos luxuriosos) e seria usada naquela única ocasião para, praticamente, nunca mais ser retirada do lugar em que guardariam-na, ocupando um espaço inutilmente. "Afinal, que ocasião mesmo requeria uma bandeja daquela?". Terminou o que precisava fazer no banheiro e saiu forçando um pequeno sorriso no rosto.
     — Que surpresa agradável amor. Pegou-me desprevenida. Há que devo a grande honra de um café-da-manhã na cama?
     — É nosso aniversário de namoro, sua tolinha.
     — Nossa. Esqueci completamente.
     — Tudo bem. Sou eu quem sempre esqueço mesmo. Isto é para compensar todas as vezes que eu esqueci.
     — Obrigada. Realmente não precisava. Este dia é tão seu quanto meu.
     — Eu sei. Por isto mesmo que comprei, para hoje a noite, dois ingressos para vermos aquela peça teatral que tanto queríamos.   Você vai ter que faltar o trabalho hoje por motivos de força maior..!
     — E com prazer!
        ...
     Caindo então no prazer, um nas caricias do outro, curtiram aquela manhã intensamente, se fartando, ambos, daquele café-da-manhã após ato. Só então ela reconheceu as maravilhas de ter uma bandeja de cama e teve a certeza de que não era um item para se ficar guardado juntando poeira. "Que se dane o preço que isto custou. Vai valer cada centavo!".

     Já no anfiteatro, o relógio marcava o horário de início da peça indicado no ingresso, mas como de costume, as companhias tem o terrível hábito, nada educado, de esperar mais meia hora antes de realmente entrarem ao palco, sempre com a péssima desculpa de que é para esperar mais gente chegar. Se eles não vão ser pontuais, porque sua plateia deveria? Respeito gera respeito... Além do mais, eles não ganhariam nem menos nem mais por apresentarem na hora ou depois, já que os ingressos são comprados antecipadamente.
     Todavia, tais pequenos inconvenientes nem chegaram a percepção daquele feliz casal, que para eles tudo estava perfeito. Exceto quando um sujeito, com o rosto encoberto, subiu ao palco e anunciou um assalto, mostrando que em cada porta de saída haviam mais de seus semelhantes aos pares. Isso por se só já era bastante pertubação para uma noite, porém não há situação que não possa ficar pior: Atrás da cortina um assistente de palco que está sendo abordado por um dos assaltantes derruba um candelabro, parte do cenário, na tapeçaria e começa um incêndio que avançava rapidamente e que era não contido (devido as ações limitadas que os reféns possuíam).
     A falta de reação e a indecisão dos assaltantes diante do caso, fez chegar a situação de insustentabilidade do assalto. Ou todos ficariam presos ali repassando seus pertences enquanto eram cercados pelo fogo ou o assalto acabava e todos fugiriam do lugar. Neste momento, o sujeito que estava no palco respirou fundo e disse calmamente:
     — Senhoras e senhores, obrigado por participar deste assalto mal sucedido. Por favor, levantasse e saiam em pânico e desordenadamente pelas saídas que estão atrás de vocês. Pois se algum momento da sua vida é para se deixar tomar por estes sentimentos, uma boa hora é agora. Tenham uma boa noite.
     Por medo ou por choque para com relação aos acontecimentos, como numa psicologia reversa, todos, incrivelmente, se levantaram e saíram calma e ordenadamente em fila.
     ...Até, claro, o fogo afugentar os residentes do teatro e alguém gritar "RATOOOOO" de um lado e "BARATAAAA" do outro...
     E assim o mundo reinou em caos e destruição até o cair do sono.

sou forte, sou por acaso


Teve um dia em que jogamos nossos barcos na enxurrada pensando que eles iam de bueiro em bueiro até chegar numa enseada. Nisso tinha um quê de infância que não queria ir embora nem nunca foi, nem nunca permitiu que a gente admitisse que os barcos de papel viravam a esquina e afundavam, mas nós continuamos. Então, depois que você ficou longe, comecei a reparar que os tijolos de argila bem no muro da minha casa escondiam outros muros estendidos além, tantos muros, tão além, que não restou uma cerquinha lá longe com uma placa dizendo: aqui é o resto do mundo. Só restaram as passagens de labirinto, individuais, estreitas, sufocantes, minha nossa, tenho tanta coisa para falar, te ouço andar do outro lado, sai da sua trincheira e vem pra cá, home is wherever I’m with you, eu não entendo o sistema de eleição dos Estados Unidos, hoje olhei pra alguém que não conheço, que olhou pra mim por muito tempo e a gente ficou puxando um cabo de guerra, porque é muito difícil não desviar os olhos nessa situação, mas um de nós dois tinha que desviar de uma vez por todas antes que a corda arrebentasse ou meus olhos ou os olhos do lado de lá do buraco do muro. Não sei, mais cedo eu estava pensando na história desse cara que colecionava rolhas e o quarto dele tinha milhões de rolhas e elas vazavam sempre que a porta se abria, ou a janela, porque não havia nada para tapar a porta ou a janela, daí ele comprou tijolo e fez cimento com cuspe, construiu um muro na soleira e no parapeito, ficou preso lá dentro e morreu. O cara só morreu porque fechou a vazante das paredes e esqueceu de fechar os gargalos das garrafas de destilado, bebeu tudo, entrou em coma e na solidão da convulsão fez verdade sua morte, mas como esta história é ruim demais eu nunca vou escrevê-la. Vai, faz de conta que ela também morreu na memória deste parágrafo e só tô te contando isso pra você ver que foi daí que eu tirei a ideia de abrir mais um pouco o buraco do muro, como o cara da história nunca vai fazer, pra ver se eu encontro aquele olhar de novo, o do cabo de guerra, sabe? Pois é, talvez eu consiga abrir um buraco um pouco maior, talvez se eu esticar bem a mão eu consiga alcançar a sua, talvez eu até atravesse ou cresça por dentro suficientemente pra notar que só existe meio metro de tijolo e eu ando arrastado no chão, corcunda nato. Afinal esse negócio de muro é só paranoia, se eu quisesse ficar de pé ou se eu pudesse sair daqui de dentro da cápsula da complexidade, teria me levantado.
O muro é tão pequeno, só barra mesmo aqueles barcos de papel que pensávamos de mentirinha que desembocavam no mar e a televisão transmitia que eram parte do lixo que entupia suas bocas-de-lobo. Na verdade, eles viraram a esquina e continuam ali, parados na porra do muro, como nós continuamos. 


e faltam oito anos pra abrirmos a cápsula do tempo!

O Real brilho dos diamantes

             Até onde se sabe, e temos razões sensoriais para tal, existem réplicas deveras verídicas, se é que me entendem a metáfora. Supostas falsificações que são em tudo como seus “originais”, estes que recebem tal nome muito mais por um caráter pioneiro ou por um fetiche de marca do quê pela qualidade ou qualquer outra coisa. Naturalmente que existem os casos, e admito não serem poucos, das coisas que só nos servem “originais” - e reitero a abstração semântica do termo. - mas admitamos que existem réplicas tão boas, ou “segundas marcas” até melhores que as ditas “grandes marcas” ou os “originais”.
          Poderia eu pegar exemplo de marcas consagradas, de emblemas que carimbam gerações, de etiquetas que têm história no percurso humano do consumo. Mas partirei, para melhor valoração de meu ponto de vista, de um exemplo mais natural, menos adornado, embora não menos fetichizado. Trato dos diamantes.
               O fetiche por esta preciosa pedra, que, diga-se de passagem, não tem nada de tão valioso assim se em estado natural. Ele passa a causar palpitações nos corações é quando tratado, beneficiado, lixado, modelado... deem o nome que apetecer-lhes. O que se lhe dá substância enquanto produto é a mais-valia de um trabalho humano; o que dizem dar-lhe valor é o seu caráter raro, o que não é verdade, pois sem um trabalho de um perito competente o valor da pedra cai substancialmente. O que lhe dá valor no que se refere ao apreço social é o preço que pagam por ele, pura e simplesmente. Crê que não, leitor? Realmente intenta pensar que é mesmo o caráter seleto do ordenamento dos carbonos que formam o diamante que lho conferem o status de “posse monarca”? Então vamos lá.
               Existem elementos tão ou mais raros que o diamante na natureza, mas o fetiche por estes produtos não é tanto quanto o do emblemático diamante, o que já elimina acreditar que simplesmente por ser raro o diamante tem estima social; claro que seu caráter solene na natureza empenha-lhe um preço alto de comércio, se bem trabalhado, mas trato aqui é do valor que ele tem perante o social. Sim, em certa medida esbarra no caráter solene dele no meio natural, mas tão somente porque cobram horrores para pegá-lo de lá.
              O que atribui valor ao diamante é o preço que pagam nele. Basta pensar que existem réplicas que emulam seu brilho peculiar de maneira maestral, idêntica até, ao dito “original”. Estas peças só não têm o mesmo valor aos olhos populares, embora sendo esteticamente idênticas, pela ausência do caráter fetichista esdrúxulo e absurdo que é pagar milhares de reais para por uma pedra lixada sobre um dos dedos.
             Alguns até dirão: “Mas Ian... Estas réplicas que você cita não têm a resistência do diamante, não têm seu caráter duro.” e admito que elas estejam certas, mas nunca vi um portador deste adorno, ou portadora, sair por ai dando marteladas em seus anéis ou brincos para mostrar a rigidez da rocha que porta. Ninguém lho faz; certamente fazem é encher de não-me-toques aqueles mais ávidos por acariciar a fria superfície do calhau.
               Enfim. Diamantes causam orgasmos não por serem belos, mas por serem caros; dinheiro é fetiche; esse é meu ponto. Deste modo entendemos a ensandecida busca pelas marcas, pelo caro... e não basta ser caro, como indiretamente salientei com este texto... têm de haver também a impressão popular. Estas duas em conjunto moldam os consumos sociais, as aspirações e as noções de valor e de belo, de aceitável, de agradável. Absurdos como estes são os que nos permeiam o tempo todo.

Azul e rosa são só cores de céu com humores diferentes



Donas de casa são hipócritas e CEO’s de grandes empresas têm, sim, consciência coletiva. A sua mãe é machista e o seu amigo não gosta de futebol. Sua namorada não conversa pelos cotovelos, nem é ciumenta demais, nem é mais implicante que você. E o seu namorado, em contrapartida, não é igual ao namorado da sua amiga.

Uma das piores coisas que o ser humano jamais vai ser capaz de fazer é estereotipar. Nós somos tão complexos, tão diferentes; sempre fomos, e, apesar desse jeito de pensar todo ‘globalizado’, ainda continuamos diferentes. Por isso, fecho os ouvidos pra essas pessoas que insistem em dizer que os homens são todos iguais ou que o outro gênero idem. Que mães isso e pais aquilo. Meninos de azul, meninas de rosa.

Isso só demonstra mente pequena e falta de criatividade e sensibilidade. Cada um de nós é um universo. Há tanta coisa na mente de cada um, tantas escolhas distintas, experiências boas e ruins... E, quanto tudo te escapar à ponta da língua, não se esqueça do código genético, cada um tem o seu, e isso é fato científico, caros ‘estereotipadores’.